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Publicado em
12/4/23

Interpretação da gasometria: principais conceitos e identificação dos distúrbios

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Interpretação da  gasometria: principais conceitos e identificação dos distúrbios

A gasometria arterial é um exame de sangue arterial que tem como objetivo avaliar os gases presentes no sangue, suas distribuições, medir o pH e o equilíbrio ácido-base. É um exame de grande importância na prática clínica e nas provas de residência. Entenda agora como interpretar uma gasometria e como identificar os distúrbios.

Equilíbrio ácido-base

O corpo humano funciona num equilíbrio entre o pH ácido e básico, entre o CO2 (ácido) e o HCO3 (base), produzindo substâncias ácidas e básicas que precisam ser eliminadas, seja por via metabólica ou respiratória, para manter esse equilíbrio e um bom funcionamento.

Nosso corpo elimina o CO2 através do pulmão e elimina HCO3 por excreção renal, sendo os mecanismos que mantêm o pH dentro dos valores normais para funcionamento. 

Equilíbrio ácido-básico. Fonte: Centerlab ‍link: Centerlab 
Equilíbrio ácido-básico. Fonte: Centerlab 

Valores normais

Os valores de referência são:

pH 7,35 – 7,45
pCO2 35 - 45 mmg
HCO3 21 – 27 mEq/L
pO2 80 - 100mg
Valores normais da gasometria. Fonte: EMR

Além desses parâmetros, a gasometria também nos dá informações como saturação de oxigênio, base excessiva, ânion gap e alguns eletrólitos (sódio, potássio, cálcio iônico e cloreto).

O que deve ser analisado?

Primeiro passo 

A primeira coisa a ser analisada é o pH. Se o pH for < 7,35, o corpo encontra-se em acidemia. Se o pH for  > 7,45, o corpo encontra-se em alcalemia.

Segundo passo 

Depois de analisado o pH, vamos analisar o CO2 e o HCO3 para identificar a acidose ou alcalose:

  • Acidose respiratória: acidemia com o CO2 alto e o HCO3 normal
  • Acidose metabólica: acidemia com o HCO3 baixo e o CO2 normal
  • Acidose mista: HCO3 estiver baixo e o CO2 alto, simultaneamente
  • Alcalose respiratória: alcalemia com o CO2 baixo e o HCO3 normal
  • Alcalose metabólica: alcalemia com HCO3 alto e o CO2 normal
  • Alcalose mista: HCO3 alto e o CO2 baixo, simultaneamente

Terceiro passo

O terceiro passo na avaliação é avaliar a compensação

  • Acidose metabólica: a compensação ocorre por meio da hiperventilação (objetivo de reduzir CO2).
  • Alcalose metabólica: há sinais de hipoventilação com o objetivo de reter CO2
  • Acidose respiratória: ocorre uma retenção de HCO3
  • Alcalose respiratória: ocorre eliminação renal de HCO3.

Como interpretar a gasometria?

Acidose metabólica

Na acidose metabólica, há um aumento da excreção de HCO3. Isso causa um acúmulo de ácidos, como lactato, sulfatos e corpos cetônicos. Além da diminuição de HCO3 na gasometria, pode haver um aumento do anion gap.

Algumas causas de acidose metabólica são: acidose lática (sepse e choque), cetoacidose diabética, intoxicação exógena, diarreia grave, insuficiência renal aguda (IRA) e acidose tubular renal (ATR). O paciente pode se apresentar com hiperventilação (sinal de compensação), hipotensão e má perfusão (devido à depressão miocárdica) e hipercalemia.

O tratamento é feito por meio do tratamento da causa base. Pode repor bicarbonato se o pH for < 7,1, < 7,2 + IRA ou < 6,9 na cetoacidose. Para calcular a quantidade usa-se as fórmulas: 1-2 mEq/kg ou 0,3 x peso x BE (base excess).

Dica para o internato de medicina

No paciente com ânion gap (AG) aumentado, pensar em acidose lática, cetoacidose, intoxicações e IRA avançada. No paciente com AG normal, pensar em diarreia e ATR. O valor esperado para é entre 8 e 12 mEq/ml, para calculá-lo é utilizada a seguinte equação:

AG = Na+ - (Cl- + BIC)

Alcalose metabólica

Na alcalose metabólica há uma diminuição na excreção de HCO3. Ela decorre de um acúmulo de bicarbonato (BIC) e tem as seguinte causas como as principais: alcalose de contração (grande perda de volume extracelular), shift intracelular de H+, perda gastrointestinal de H+ (vômitos e uso de laxativos) e perda renal de H+ (hiperaldosteronismo).

Se a alteração for depleção volêmica, o indivíduo vai se apresentar com câimbras, fadiga e hipotensão postural, sendo a reposição volêmica o tratamento. Porém, se for a causa da hipocalemia, hipocalcemia e hipomagnesemia faz-se a correção eletrolítica. Por fim, se a causa for hiperaldosteronismo, é utilizada a espironolactona.

Acidose respiratória

Na acidose respiratória ocorre um aumento da pCO2, na maioria das vezes causada por doenças que levam à hipoventilação. As causas agudas incluem uso de drogas, AVE e neoplasias que causem depressão do SNC e doenças neuromusculares, como miastenia gravis. As causas crônicas incluem DPOC e escoliose.

O paciente apresenta sinais de hipercapnia (cefaleia, ansiedade e confusão) e hipoxemia grave. Se o quadro for grave, pode causar depressão miocárdica. O tratamento nos casos agudos é feito por meio da ventilação. Nos casos crônicos, como há maior compensação de bicarbonato, a conduta é conservadora, buscando tratar a causa base.

Alcalose respiratória

A alcalose respiratória ocorre devido a hiperventilação, que resulta na queda de CO2. As causas podem ser centrais, como ansiedade, gestação, dor, tireotoxicose e AVE ou pulmonar, como pneumonia, asma, TEP e IC. O paciente se apresenta com hiperventilação e cefaleia (devido vasoconstrição cerebral). O tratamento pode ser feito com sintomáticos e tratamento da causa base.

Conclusão

A gasometria arterial é um exame que nos dá informações sobre o equilíbrio ácido-básico, podendo diagnosticar quadros de acidose metabólica ou respiratória, alcalose respiratória ou metabólica e distúrbios mistos. Para você que está no internato de medicina ou já é médico e quer se atualizar, vamos entender melhor com exemplos PRÁTICOS? Abaixo está o link de uma aula sobre Gasometria Arterial pelo Dr. Amadeu Marinho. 

Leia mais:

FONTE:

FURONI, Renato; et. al. Distúrbios do equilíbrio ácido-básico. Rev. Fac. Ciência. Méd. Sorocaba, v. 12, n. 1, p. 5 - 12, 2010.