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Publicado em
20/1/21

Entenda como fazer o rastreio da sífilis

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Entenda como fazer o rastreio da sífilis

O Brasil, hoje em dia, enfrenta uma epidemia de sífilis, com salto de 2,1 para 75,8 casos para cada 100 mil habitantes na última década. No blog, já existe um post que trata da epidemiologia, etiologia, fisiopatologia, tratamento e aspectos clínicos dessa doença tão importante na conjuntura atual do país. A postagem de hoje vai ser dedicada a explicar como fazer o rastreio dessa doença, uma vez que você se depara com um paciente com suspeita da doença.

Sinais e sintomas para realizar o rastreio da sífilis

Paciente sintomático

Ao se deparar com um paciente sintomático para a sífilis, o rastreio precisa ser feito se o paciente apresentar:  

  • Úlcera genital não dolorosa (no caso da sífilis primária), rash cutâneo difuso, macular ou papular no tronco e extremidades (sífilis secundária) e a paresia e tabes dorsalis (sífilis terciária);
  • Se o paciente for sexualmente ativo, com úlcera ou rash cutâneo no tronco e extremidades não diagnosticados;
  • Sintomas menos específicos para sífilis (disfunção dos pares cranianos, dor de cabeça crônica, insuficiência da valva aórtica, meningite, doenças meningovasculares), principalmente se esses sintomas não tiverem nenhuma outra etiologia reconhecida.

Paciente assintomático

Já os pacientes assintomáticos que precisam ser testados são:

  • Mulheres grávidas, independentemente de estarem no grupo de risco;
  • Pacientes com parceiros sexuais que tiveram sífilis primária, secundária ou latente precoce;
  • Homens que fazem sexo com homens (HSH);
  • Pacientes HIV positivos;
  • Pacientes que tenham atividades sexuais de alto risco;
  • Pacientes com histórico de encarceramento;
  • Profissionais do sexo.

Como realizar o diagnóstico da sífilis?

Os testes recomendados para o diagnóstico da sífilis, tanto na fase latente quanto sintomática, são os testes sorológicos. Esses vão ser reagentes, ou seja, positivos, de acordo com a resposta imune humoral à infecção. Assim, pacientes imunossuprimidos ou que recentemente contraíram a doença podem apresentar falsos negativos, uma vez que não houve uma produção de anticorpos eficiente para reagir ao exame.

É por isso que é preciso realizar pelo menos dois testes sorológicos em sequência para a confirmação do diagnóstico, e, assim, diminuir a chance de falsos positivos e falsos negativos.

Teste treponêmico

O primeiro exame sorológico que tem preferência para ser feito é o teste treponêmico. É um exame mais específico que o teste não treponêmico (que vai ser discutido logo adiante), porque detecta anticorpos específicos para a T. pallidum (bactéria responsável por causar a sífilis).

A partir do momento em que este exame é dito como “reagente”, ele permanece assim para o resto da vida, independentemente se o paciente apresenta infecção ativa ou não.

Por isso, não pode ser usado para confirmar uma reinfecção. Alguns exemplos de testes treponêmicos são o teste rápido, que dentre todos os testes treponêmicos tem prioridade para ser feito; FTA-Abs; TPHA e EQL.

Teste não treponêmico

O segundo exame a ser realizado é o teste não treponêmico. Ele não é específico, porque o resultado é dado de acordo com a reatividade do sistema imunológico do paciente infectado ao antígeno cardiolipina-colesterol-lecitina. A quantidade de anticorpos reagindo a esse antígeno (tanto IgG quanto IgM) vão indicar o quão ativa está a infecção.

Este teste mostra seus resultados de acordo com titulações. Sendo assim, caso o resultado seja 1:32, por exemplo, quer dizer que mesmo diluindo 32 vezes a amostragem do paciente, ainda foi possível detectar anticorpos reagindo contra os antígenos.

Por isso, quanto menor for a diluição para detectar dos anticorpos, menos ativa está a infecção. É um exame barato, fácil de ser executado e, justamente por seu resultado ser dado em diluições é utilizado para acompanhamento da evolução do tratamento do paciente.

Desse modo, se o indivíduo testou 1:32 no primeiro exame e após o tratamento testou 1:8, significa que a resposta terapêutica está sendo eficiente. Entretanto, é importante lembrar que o título tende a diminuir, mesmo sem o uso da medicação, mas a medicação acelera esse processo.

Alguns exemplos de testes não treponêmicos são o PRP, VDRL e TRUST.

Para analisar os resultados dos testes sorológicos, precisamos considerar a presença ou não de sinais clínicos, história prévia de sífilis e a situação imunológica do paciente.

Leia mais:

Interpretando os resultados

Quando o teste treponêmico é reagente e ao realizar teste não treponêmico como segundo exame, esse também vir reagente, existem duas possíveis interpretações:

  • Podemos dar o diagnóstico de sífilis para o paciente. Se esse for o caso, é preciso classificar o estágio em que o paciente se encontra na doença, tratar e monitorar com teste não treponêmico, e fazer a notificação.
  • Caso o paciente apresente uma cicatriz sorológica (ou seja, uma queda de titulação de pelo menos duas diluições desde o tratamento anterior), devemos apenas fazer orientações. A permanência de uma titulação baixa, mesmo após o tratamento, vai caracterizar a cicatriz sorológica, e é preciso ter cuidado com os falsos positivos nesse caso.

É importante enfatizar que caso o primeiro exame realizado seja o não treponêmico, com resultado reagente, seguido da realização do teste treponêmico com resultado também reagente, a conduta a ser seguida vai ser a mesma explicada acima.

Caso o paciente realize o teste treponêmico e o resultado seja reagente, mas ao fazer o teste não treponêmico, o resultado seja não reagente, é preciso realizar um terceiro teste treponêmico, diferente do primeiro. Nesse caso, três condutas podem ser adotadas:

  • Se houver reação do terceiro exame, é possível diagnosticar o paciente com sífilis ou com cicatriz sorológica. Nesses casos, as condutas são as mesmas das expostas acima: em caso de confirmação, classificar o estágio, tratar, monitorar com o teste treponêmico e notificar. Caso seja encontrada a cicatriz sorológica, apenas orientar o paciente;
  • Se não houver reação, considera-se que o primeiro teste foi falso positivo e é excluído o diagnóstico de sífilis;
  • Caso não seja possível realizar o terceiro exame treponêmico, considera-se a exposição do paciente, os sinais e sintomas e histórico de tratamento para prosseguir com a conduta.

Caso o paciente realize primeiro o teste não treponêmico, e esse vier positivo, e como segundo exame ser feito o treponêmico, e esse vier negativo, a conduta é a mesma dita acima.

Se o paciente realizar qualquer um dos exames sorológicos, e esse vier negativo, não se deve realizar o teste complementar caso o paciente não apesente sintomas clínicos da fase primária.

É importante considerar a janela imunológica da sífilis precoce, e solicitar uma nova coleta após 30 dias. Entretanto, isso não deve retardar o tratamento, especialmente se o diagnóstico da sífilis for o mais provável ou se o retorno do paciente para o serviço de saúde não seja garantido.

Fontes:

  • HICKS, B Charles. CLEMENT, Meredith. Syphilis: Screening and diagnostic testing. UpToDate. 2020. Disponível Aqui
  • BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Para Atenção Integral às Pessoas com Infecção Sexualmente Transmissível (IST). Brasília, DF, 2020.