A Atresia Tricúspide faz parte do grupo de condições cardiológicas chamadas de “Cardiopatias congênitas”, as quais se tratam de malformações cardíacas que podem ser diagnosticadas ainda em momento intra-útero. Por esse motivo, o ecocardiograma intrauterino vem ganhando espaço no contexto da rotina pré-natal, sendo até discutida a sua obrigatoriedade. Vamos entender o mecanismo dessa malformação?
Atresia tricúspide: Entenda essa malformação cardíaca e suas consequências
A Atresia Tricúspide é uma cardiopatia congênita cianótica caracterizada pela ausência completa da válvula tricúspide, o que impede a comunicação direta entre o átrio direito e o ventrículo direito do coração. Essa malformação leva a um desvio obrigatório do fluxo sanguíneo, geralmente por meio de uma comunicação interatrial e, frequentemente, de um defeito do septo ventricular ou um canal arterial patente, permitindo a oxigenação parcial do sangue.
Durante o desenvolvimento embrionário, a atresia tricúspide acontece por uma falha na formação dos coxins endocárdicos (responsáveis pela formação das válvulas atrioventriculares). Ainda que a etiologia exata permaneça incerta, não há evidência conclusiva de uma predisposição genética direta.

Atresia tricúspide: como reconhecer os sinais clínicos no recém-nascido?
O quadro clínico da atresia tricúspide costuma se manifestar nas primeiras semanas de vida, com sinais que refletem a gravidade das alterações hemodinâmicas causadas pela malformação. A redistribuição do fluxo leva a uma sobrecarga das câmaras esquerdas e gera hipoplasia do ventrículo direito, além das mudanças na perfusão pulmonar, que são os principais determinantes da apresentação clínica.
Quando há obstrução ao fluxo pulmonar (por atresia ou estenose da valva pulmonar, ou pela ausência de uma comunicação com a artéria pulmonar) o sangue depende de estruturas como o ducto arterioso para alcançar os pulmões. Nestes casos, predomina a cianose intensa, especialmente após o fechamento fisiológico do canal arterial.

Por outro lado, nos casos em que há um CIV grande e fluxo pulmonar preservado ou aumentado, pode ocorrer sobrecarga pulmonar com sinais predominantes de insuficiência cardíaca congestiva, como taquipneia, sudorese ao se alimentar, ascite, dificuldade de ganho de peso e hepatomegalia. Essa variedade de apresentações clínicas pode ser encaixada na classificação clínica da doença:
Outras manifestações clínicas incluem baqueteamento digital após os três meses de idade, pulsos periféricos variáveis e murmúrios cardíacos múltiplos, como o holossistólico. A ausculta também pode revelar uma primeira bulha cardíaca única e intensa, além de alterações na segunda bulha cardíaca, cuja intensidade varia conforme a anatomia das grandes artérias.

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Diagnóstico: como não confundir com outras cardiopatias cianóticas
O diagnóstico da atresia tricúspide começa ainda na gestação e se estende ao período neonatal e em casos de falta de acesso a recursos de saúde, pode iniciar apenas como lactente. Com o avanço da ecocardiografia fetal, tornou-se possível identificar a malformação já durante a 22ª semana de gestação, embora em alguns casos possa ser detectada ainda mais cedo. A suspeita se dá pela ausência do fluxo tricúspide e pela hipoplasia do ventrículo direito.

Nos casos em que o diagnóstico não é feito antes do nascimento, a suspeita clínica surge a partir da apresentação de cianose nas primeiras horas ou dias de vida, especialmente após o fechamento fisiológico do ducto arterioso. A triagem neonatal com oximetria de pulso pode sugerir hipóxia, e a presença de sopros cardíacos pode motivar uma investigação do achado.
O exame de escolha para confirmação diagnóstica é a ecocardiografia transtorácica, que demonstra diretamente a ausência da valva tricúspide e a comunicação interatrial obrigatória (geralmente um forame oval ou defeito do septo atrial), além de permitir a avaliação anatômica das demais estruturas cardíacas, como o septo interventricular, artérias grandes e a presença de estenoses ou atresias associadas. O Fluxo Doppler colorido complementa essa avaliação.
Embora a cateterização cardíaca não seja rotineiramente necessária para estabelecer o diagnóstico, ela pode ser indicada em situações específicas, como quando há suspeita de comunicação interatrial restritiva que comprometa a oxigenação adequada. Nesses casos, pode ser feita uma septostomia atrial com balão, procedimento paliativo que visa melhorar o fluxo sanguíneo entre os átrios.
Além disso, a investigação genética pode ser recomendada, especialmente em casos com suspeita de síndromes associadas, como trissomias, síndrome de VACTERL ou microdeleção 22q11. Essa abordagem genética pode ajudar a orientar o prognóstico e o aconselhamento familiar.

Manejo clínico e cirúrgico da atresia tricúspide: o que o residente precisa saber?
O tratamento da atresia tricúspide é baseado em uma abordagem em 3 etapas, que visa adaptar a circulação sanguínea à anatomia característica da doença, onde há apenas o ventrículo esquerdo como funcional. A estratégia terapêutica busca redirecionar o sangue venoso sistêmico diretamente para os pulmões, sem a intermediação de uma câmara de bombeamento direita. Essa abordagem requer intervenções cirúrgicas progressivas ao longo dos primeiros anos de vida.
Estabilização inicial
Nos primeiros dias após o nascimento, a prioridade é estabilizar o RN. Em casos de obstrução ao fluxo pulmonar ou comunicação interventricular pequena, o bebê depende do canal arterial para garantir a oxigenação. Nesses casos, a infusão contínua de prostaglandina E1 é essencial para manter o ducto arterioso patente. Quando há sinais de congestão pulmonar, o uso de diuréticos pode ser necessário para aliviar os sintomas de insuficiência cardíaca.
Primeira fase: Estabelecimento do fluxo pulmonar
A abordagem cirúrgica inicial na atresia tricúspide depende do tipo anatômico e do fluxo sanguíneo pulmonar:
- Com obstrução ao fluxo pulmonar: Realiza-se um shunt sistêmico-pulmonar, geralmente o de Blalock-Taussig modificado, para aumentar a oxigenação.
- Com fluxo pulmonar excessivo (sem obstrução): Indica-se bandagem da artéria pulmonar para evitar hiperfluxo pulmonar. Em casos equilibrados, pode não haver necessidade de cirurgia imediata.
- Com transposição das grandes artérias e obstrução sub-aórtica: Indica-se o procedimento Damus-Kaye-Stansel, que conecta a artéria pulmonar à aorta, geralmente com um shunt associado.
Segunda fase: Redirecionamento do retorno venoso superior
Por volta dos 6 meses de idade, é realizada a anastomose cavo-pulmonar superior. Nesse procedimento, a veia cava superior é conectada diretamente à artéria pulmonar direita, permitindo que o sangue que vem da parte superior do corpo alcance os pulmões passivamente, sem passar pelo coração.
Terceira fase: Circulação total cavo-pulmonar
A etapa final, geralmente realizada entre 2 e 4 anos de idade, é o procedimento de Fontan, em que a veia cava inferior é conectada à artéria pulmonar, completando a separação das circulações sistêmica e pulmonar. A conexão pode ser feita com um conduto extracardíaco ou intra-atrial, e inclui uma pequena fenestração que atua como válvula de escape temporária, permitindo um desvio mínimo de sangue para o átrio direito, caso a pressão pulmonar se eleve no pós-operatório imediato.

Considerações a longo prazo
Com o passar dos anos, o acompanhamento clínico regular é essencial para monitorar a função ventricular, pressão pulmonar e eventuais complicações do circuito de Fontan, como arritmias, proteinúria, disfunção hepática ou insuficiência ventricular. Quando há queda progressiva da função cardíaca e sintomas refratários, o transplante cardíaco pode ser considerado como alternativa terapêutica definitiva.
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FONTES:
- Sivarajan VB, Penny DJ. Tricuspid Atresia [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2024 Jan–.
- Reddy VM, Lamberti JJ. Tricuspid Atresia: Overview [Internet]. Medscape.
- Reddy VM, Lamberti JJ. Tricuspid Atresia: Clinical Presentation [Internet]. Medscape.
- Reddy VM, Lamberti JJ. Tricuspid Atresia: Treatment & Management [Internet]. Medscape.