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26/4/22

O que é a Incompetência Istmo Cervical, quais as causas e como tratar?

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O que é a Incompetência Istmo Cervical, quais as causas e como tratar?

A Incompetência Istmocervical (IIC) ou Incompetência Cervical, além de ser um tema que cai com frequência nas provas de residência, é um ponto de muita angústia para as gestantes. 

Isso ocorre, pois esta condição provoca perdas fetais de repetição, um evento que sempre é muito traumático para as mães e familiares. 

Vamos discutir um pouco sobre esse tema para podermos reconhecê-lo precocemente e fornecer o manejo adequado.

O que é incompetência istmocervical?

A IIC aumenta o risco de prematuridade. Fonte: Reprodução/Adobe Stock/ Anekoho
A IIC aumenta o risco de prematuridade. Fonte: Reprodução/Adobe Stock/ Anekoho

É definida pela ACOG (American College of Obstetrics and Gynecology) como a incapacidade do colo do útero de manter a gestação no segundo trimestre da gravidez. 

Essa condição leva à dilatação precoce do colo, o que provoca trabalho de parto prematuro e perdas fetais recorrentes indolores, e com ausência de trabalho de parto ou contrações clinicamente efetivas.

Origem da Incompetência Istmo Cervical

O fundamento fisiopatológico dessa condição é a fraqueza estrutural do colo uterino, que pode decorrer de diversas causas.

Cirurgias ou traumas 

Essas são as causas mais comuns. Cirurgias cervicais ou traumas prévios podem causar alterações mecânicas no colo uterino, diminuindo sua capacidade de sustentação. 

Os principais procedimentos associados são a conização e a cirurgia utilizando radiofrequência para tratamento de lesões precursoras de câncer de colo do útero. 

Além disso, a curetagem, dilatação cervical para histeroscopia e lacerações do trajeto de parto também demonstraram associação.

Alterações hormonais

A queda dos níveis de progesterona (hormônio essencial para a manutenção da gestação) pode estar implicada no encurtamento do colo.

Infecções

Processos inflamatórios intra-amnióticos, podem estar associados ao apagamento cervical precoce e trabalho de parto prematuro.

Alterações congênitas 

Malformações müllerianas como útero bicorno, didelfo ou arqueado podem estar associados à síndrome do colo curto.

Ademais, doenças genéticas que afetam o colágeno, como a Síndrome de Ehlers-Danlos, também podem ser causas.

Como diagnosticar?

O diagnóstico dessa condição basicamente  se apoia na história obstétrica clássica e na avaliação por exames de imagem.

O relato de mais de duas perdas fetais acima de 14 semanas ou partos prematuros até 28 semanas, associados a ausência ou poucos sintomas de trabalho de parto, permite o diagnóstico da Incompetência Istmocervical

Nas pacientes que tiveram apenas um episódio compatível com essa história, pode-se lançar mão de ultrassonografia transvaginal para confirmar o diagnóstico.

Nas mulheres que apresentam essa história de perda fetal ou parto prematuro prévio, deve-se conduzir uma avaliação com USG transvaginal a cada duas semanas entre 14 e 24 semanas de gestação, a fim de medir o comprimento do colo do útero. 

A determinação de um comprimento de colo menor que 25mm permite o diagnóstico dessa condição. 

Para mais, deve-se excluir outras condições como trabalho de parto, infecções, e hemorragias por descolamento prematuro de placenta ou por placenta prévia. 

Pacientes assintomáticas, que não apresenta história prévia de perdas fetais, serão rastreadas para a IIC no pré-natal, através do USG morfológico do segundo trimestre.

Resumindo, situações que permitem o diagnóstico de Incompetência Istmocervical são:

  • História obstétrica clássica (com 2 ou mais eventos prévios)
  • História obstétrica sugestiva (só 1 evento) + Colo <25mm no USG transvaginal

O achado isolado de comprimento de colo <25mm no exame de imagem não é diagnóstico de Incompetência Istmocervical, pois não tem a história associada, é apenas o achado de colo curto.

Apesar disso, essa situação está associada a um maior risco de parto prematuro e perda fetal, e merece atenção e tratamento específico.

Possíveis tratamentos da Incompetência Istmocervical

Suplementação com progesterona

A partir de 16 semanas está indicada a suplementação de progesterona nessa condição. Pode ser administrada via intramuscular uma vez por semana, ou por via vaginal diariamente. 

Essa medicação deve ser mantida até o termo, ou até o parto, e está indicada de forma geral em todos os casos de IIC.

Cerclagem cervical profilática

Exemplo de como fica o colo do útero com a cerclagem. Fonte: Prematuridade.com
Exemplo de como fica o colo do útero com a cerclagem. Fonte: Prematuridade.com

A cerclagem consiste na realização de suturas no colo de útero, visando auxiliar sua capacidade de contenção mecânica da gestação, impedindo seu maior encurtamento e apagamento precoce.

Esse procedimento está indicado nas gestantes com história obstétrica típica de Incompetência Cervical (ver acima) e deve ser realizada entre 14 e 16 semanas de gestação. 

Nas gestantes com história de apenas um evento, a cerclagem pode ser considerada se o comprimento de colo do útero for <25mm, mas principalmente se for <15mm. 

A cerclagem deve ser removida entre 36 e 37 semanas de gestação, ou mais cedo no início do parto pré-termo, para evitar lesões no colo.

Nas pacientes com colo curto, mas sem história de IIC, a cerclagem não deve ser realizada. 

Mas pelo risco aumentado de perdas fetais e parto prematuro, pode ser realizada a suplementação com Progesterona neste grupo.

Quais os benefícios da cerclagem para tratamento da Incompetência Istmocervical?

É importante salientar que temos poucas evidências robustas sobre a eficácia da cerclagem comparada com outros métodos, assim como a superioridade de uma técnica de cerclagem em relação à outra. 

Mas uma meta-análise recente de ensaios clínicos randomizados demonstrou que esse procedimento conseguiu reduzir o risco de parto prematuro em 33%, e o risco de perda fetal em 18%.

As duas técnicas possíveis são a de Shirodkar, que envolve dissecção do colo e a de McDonald, a mais utilizada. 

Isso porque é a mais simples, pois ocorre apenas a realização das suturas passando pelo estroma cervical, sem necessidade de dissecção.

De forma geral, é um procedimento simples, realizado de forma ambulatorial, sendo as pacientes liberadas após recuperação anestésica.

Quais os cuidados pós cerclagem?

Não há evidência que o coito possa impor algum risco, mas de forma geral é recomendado evitar relações sexuais após uma semana do procedimento. 

Além disso, após esse período é preferível utilizar sempre preservativo, pois o sêmen possui prostaglandinas, que podem induzir alterações no colo.

Quais os riscos da cerclagem?

De forma geral, os riscos são maiores em idades gestacionais mais avançadas. As complicações são:

  • Rotura Prematura de Membranas (2-10%);
  • Migração da sutura (3-13%) – geralmente ocorre ao fim da gestação, e nesse cenário não tem grandes complicações. Mas se ocorrer precocemente, pode ser considerado repetir o procedimento, apesar de as evidências mostrarem que não há diferença em realizar uma segunda cerclagem nesses casos;
  • Infecção Intra-amniótica (2-25%).

Conclusão

A incompetência Istmocervical é uma complicação importante na gestação, levando a perdas fetais ou partos prematuros no segundo trimestre. 

Deve ser avaliada e detectada o quanto antes, através de dados da história obstétrica e exames de imagem. 

Os tratamentos para essa condição atualmente envolvem suplementação com progestágenos e a realização de cerclagem.

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Referências