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Publicado em
17/3/23

Capacidade funcional do idoso: o que é, como avaliar e manejo

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Capacidade funcional do idoso: o que é, como avaliar e manejo

A capacidade funcional do idoso é o maior preditor de morbidade e mortalidade nesse público. Assim, a presença de limitações funcionais está associada com a má qualidade de vida e necessidade de institucionalização. Entretanto, mais da metade dos idosos relatam algum grau de dificuldade de mobilidade, e cerca de 32% dos pacientes com mais de 65 anos relatam alguma dificuldade em atividades básicas, como vestir-se e escovar os dentes.

Para mais, as limitações funcionais aumentam com a idade, e são mais comuns no sexo feminino. Todavia, ao contrário do senso comum, o declínio funcional no idoso não é necessariamente inevitável, tampouco firmemente progressivo. Prova disso é que, atualmente, muitos adultos demonstram independência mesmo em idade avançada. 

Dessa forma, a avaliação da capacidade funcional do idoso é uma tarefa não apenas do geriatra, como também do médico generalista. Por isso, confira este texto com uma temática extremamente importante na prática médica e nas provas de residência!

O que é a capacidade funcional do idoso?

A capacidade funcional é definida pelo impacto que a saúde do idoso tem sobre seu ambiente e contexto social. Assim, corresponde a capacidade deste indivíduo em realizar atividades cotidianas e cumprir com seus papéis sociais. É avaliada através do questionamento ao paciente e/ou acompanhante sobre suas atividades da vida diária (AVD) básicas e instrumentais.

Atividades da vida diária básicas

Referem-se à capacidade de realizar cuidados pessoais, como andar, vestir-se e realizar higiene pessoal. Bem como usar o vaso sanitário, deslocar-se da cama para a cadeira, arrumar-se e alimentar-se sozinho.

Atividades da vida diária instrumentais

Já as atividades da vida diária instrumentais condizem com as atividades necessárias para a vida independente na comunidade em que o idoso faz parte. Assim, as AVD instrumentais são: fazer compras, realizar atividades em casa e utilizar o transporte. E mais, utilizar o telefone, controlar finanças e as suas medicações.

Neste gráfico, é possível evidenciar a prevalência da redução da capacidade funcional em idosos de acordo com sexo e faixa etária. AIVD: atividades instrumentais da vida diária. AVD: atividades da vida diária. Fonte: CURRENT geriatria: diagnóstico e tratamento, 2015
Neste gráfico, é possível evidenciar a prevalência da redução da capacidade funcional em idosos de acordo com sexo e faixa etária. AIVD: atividades instrumentais da vida diária. AVD: atividades da vida diária. Fonte: CURRENT geriatria: diagnóstico e tratamento, 2015

Dessa forma, a manutenção da funcionalidade do idoso é uma grande meta nos cuidados geriátricos. O declínio da capacidade funcional é multifatorial, apresentando uma grande gama de causas, como fatores médicos, psicológicos e sociais e ambientais. Entretanto, as doenças agudas são comumente os eventos que mais provocam declínios funcionais no idoso.

Isso porque a imobilidade, a má nutrição, a desidratação e o delirium, quadros que comumente acompanham as internações hospitalares, expõe o idoso a esse risco. E mais, outras causas que podem comprometer a capacidade funcional do idoso são: as restrições de atividade, como ficar na cama ou sentado a maior parte do dia, e quedas.

Essa última, mesmo que não provoque uma lesão diretamente ao paciente, pode vir associada ao medo de uma nova queda. Neste caso, o idoso pode diminuir suas atividades por esse receio e, dessa forma, aumentar o risco de desenvolver incapacidades funcionais.

Como avaliar o estado funcional?

O estado funcional do idoso pode ser avaliado através do autorrelato do paciente ou relato de terceiros, bem como por testes de desempenho físico e pela observação direta da execução de tarefas. A avaliação de todos esses pontos, quando possível, oferecem informações complementares.

Além disso, é fundamental na avaliação averiguar sua deambulação. Isso porque, ao comparar idosos com dificuldades de andar 400 metros com idosos sem dificuldade de percorrer essa distância, os primeiros apresentaram 1,6 vezes maior probabilidade de morte, bem como quase três vezes mais chances de desenvolver novas incapacidades nas AVDs básicas e instrumentais.

Dessa forma, a deambulação pode ser avaliada com auxílio de um cronômetro, e solicitando-se ao paciente que caminhe uma distância de 4 metros. A velocidade da marcha, quando superior a 1 m/s, sugere mobilidade intacta. Entretanto, a velocidade entre 0,6 e 1 m/s indica alto risco de desenvolvimento de incapacidades funcionais. E mais, adultos com velocidade de marcha inferior a 0,6 m/s provavelmente já apresentam alguma dificuldade nas AVDs.

Por fim, é fundamental avaliar os fatores de risco do idoso para desenvolver algum declínio funcional. Abaixo, encontra-se uma tabela com os principais fatores de risco ambulatoriais para a redução da capacidade funcional.

Comorbidades, sendo as principais: artrite, doença cardiopulmonar crônica, doenças neurológicas e dor crônica
Polifarmácia
Mais sintomas depressivos
Baixa atividade física
Obesidade ou baixo peso
Desnutrição
Desidratação
Menor interação social
Déficit de audição e/ou déficit visual
Medicações específicas como: anticolinérgicos, benzodiazepínicos
Tabela com os principais fatores de risco para redução da capacidade funcional em idosos. Fonte: CURRENT geriatria: diagnóstico e tratamento, 2015.

E mais, na tabela a seguir, encontram-se os principais fatores de risco para declínio funcional em idosos hospitalizados.

Idade avançada
Limitações funcionais pré-hospitalização
Sintomas depressivos
Déficits cognitivos
Úlceras por pressão
Repouso no leito
Delirium
Tabela com os principais fatores de risco para redução da capacidade funcional em idosos hospitalizados. Fonte: CURRENT geriatria: diagnóstico e tratamento, 2015.

Como manejar?

Idosos com dificuldades funcionais em ambiente ambulatorial podem receber a avaliação geriátrica ampla (AGA). A AGA é uma forma de avaliação do paciente idoso em diversos aspectos de sua vida. Assim, a partir desta avaliação, o paciente pode ser encaminhado para o fisioterapeuta ou terapeuta ocupacional, por exemplo.

Exemplo dos tópicos avaliados durante a AGA. Fonte: Caderneta de Saúde Pública, 2005. 
Exemplo dos tópicos avaliados durante a AGA. Fonte: Caderneta de Saúde Pública, 2005. 

Para além da importância do acompanhamento multiprofissional do paciente idoso, seu plano de tratamento precisa ser individualizado, ou seja, precisa estar adequado para as suas necessidades específicas. Observe os exemplos abaixo.

Um paciente de 65 anos com insuficiência cardíaca (IC) tem dificuldades na realização do seu acompanhamento psicológico devido a quadro muito sintomático de sua condição clínica. - Exemplo 1. Fonte: CURRENT geriatria: diagnóstico e tratamento, 2015

O paciente do exemplo acima pode se beneficiar enormemente de um tratamento mais agressivo para sua doença. Agora, observe este outro exemplo abaixo:

Paciente idoso de 65 anos com IC tem dificuldade de permanecer em pé devido a importante hipotensão ortostática. - Exemplo 2. Fonte: CURRENT geriatria: diagnóstico e tratamento, 2015

No caso do paciente acima, esse poderia se beneficiar de um tratamento menos agressivo para sua comorbidade e, dessa forma, possivelmente diminuir os sintomas de hipotensão. Por isso, é possível concluir que, no público idoso, um paciente com a mesma idade e com a mesma doença podem apresentar necessidades completamente diferentes, tornando fundamental o manejo individualizado de cada indivíduo.

Atividade na atenção básica

Na atenção básica, cujo principal objetivo é a prevenção do declínio funcional, o aumento da atividade física é a melhor intervenção. Assim, são recomendados treinos de resistência e exercícios aeróbicos, bem como treinamento do equilíbrio.

Para mais, aqueles sem sintomas cardíacos agudos, na maioria das vezes, não necessitam de testes adicionais para começar um programa de exercícios. Entretanto, as intervenções mais bem-sucedidas realizadas em idosos frágeis utilizaram um programa de exercícios individualizado, com acompanhamento do fisioterapeuta ou de outro profissional qualificado.

Conclusão

O reconhecimento da capacidade funcional do idoso é fundamental em todos os ambientes: ambulatorial ou hospitalar. Entretanto, por ser multifatorial, sua avaliação pode ser complexa. Assim, enfatiza-se a importância do acompanhamento multiprofissional do paciente idoso, a fim de diminuir o declínio de sua capacidade funcional e, dessa forma, melhorar sua qualidade de vida.

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