A intubação de Sequência Rápida (ISR) é uma habilidade crítica que pode definir o desfecho de um paciente em situações de instabilidade. Saber quando indicar e como conduzir o procedimento de forma segura e eficiente pode ser um pouco difícil, diante de tantas situações especiais e variáveis existentes, mas é essencial, especialmente em cenários de emergência onde cada segundo conta.
Atrasos podem significar perda de uma via aérea ou até a morte. Para médicos em formação e para quem se prepara para provas de residência, dominar a Intubação Orotraqueal (IOT) de sequência rápida não é um diferencial, é uma obrigação - diante da prática clínica real e das exigências das bancas.
O que é a Intubação de Sequência Rápida (ISR)?
A ISR é uma técnica de Intubação Orotraqueal (IOT) utilizada para garantir o controle rápido e eficaz da via aérea em pacientes com risco iminente de perda da ventilação ou oxigenação adequada. Seu objetivo principal é minimizar o tempo entre a perda da consciência induzida e a passagem do tubo traqueal, reduzindo o risco de aspiração e complicações relacionadas à ventilação inadequada.
Ao contrário de uma intubação convencional em ambiente controlado, como em cirurgias eletivas, a intubação de sequência rápida é realizada em contextos críticos, como insuficiência respiratória aguda, rebaixamento do nível de consciência importante ou trauma grave, em que a demora no manejo da via aérea pode comprometer a vida do paciente.
Esse tipo de intubação é uma manobra que exige preparo, conhecimento do protocolo e reconhecimento precoce das situações em que está indicada.
Indicações e contraindicações
Apesar de ser uma técnica que salva incontáveis vidas em contextos emergenciais, a intubação de sequência rápida não deve ser aplicada de forma automática ou indiscriminada. Em determinadas situações clínicas, especialmente quando há previsão de via aérea difícil ou risco elevado de falha na intubação, a paralisia muscular imediata pode eliminar mecanismos compensatórios importantes, como a respiração espontânea, e agravar ainda mais a condição do paciente. Por isso, ainda que seja uma ferramenta poderosa, deve ser feita de forma individualizada e com bastante raciocínio lógico.
Vantagens
A principal vantagem da intubação de sequência rápida é a celeridade e eficácia no controle da via aérea, essencial em pacientes com risco de deterioração iminente. A combinação de sedação e bloqueio neuromuscular permite melhores condições para a intubação, com menos reflexos de tosse, laringoespasmo ou vômitos, o que reduz o risco de aspiração.
Entre as principais indicações, estão:
- Hipoventilação
- Neuroproteção
- Proteção de vias aéreas
- Lesão de neuroeixo
Desvantagens
Existem, por outro lado, algumas contraindicações relativas à ISR, principalmente relacionadas ao risco de falha na intubação e à dificuldade de ventilação após a paralisia. Alguns pontos que são contra a realização são:
- Pacientes pediátricos (com menos de 5 anos)
- Ambiente hostil
- Falta de experiência.
- Lembre-se: a pessoa que deve realizar a ISR em momentos críticos deve ser o médico mais experiente do plantão.
- Equipe não entrosada
- Impossibilidade de via aérea cirúrgica
Como a paralisia completa pode piorar o cenário e dificultar alternativas de oxigenação, é fundamental realizar uma avaliação criteriosa da via aérea antecipadamente. Por isso, existem ferramentas, como o mnemônico “LEMON” para a previsão de dificuldade e considerar alternativas. O que cada letra representa:
L - Look externally (observe externamente)
Aqui é feita a avaliação visual do paciente, procurando por características associadas a dificuldade de intubação, como micrognatia, trauma facial, pescoço curto ou anormalidades congênitas.
E - Evaluate the 3-3-2 rule (Regra 3-3-2)
Avalia o pescoço anatômico:
- 3: pelo menos 3 dedos entre os incisivos superiores (abertura oral adequada)
- 3: 3 dedos entre o mento e o osso hióide (espessura do assoalho da boca)
- 2: 2 dedos entre o osso hióide e a cartilagem tireóide (alinhamento da laringe)
M - Mallampati score
Veja a classificação visual do espaço orofaringe com o paciente em posição sentada, boca aberta e língua para fora:

O - Obstruction (Obstrução)
A letra ‘O’ do mnmônico ‘LEMON’ representa a presença de obstruções na via aérea superior, como edema, hematomas, corpos estranhos, tumores ou epiglotite.
N - Neck mobility (Mobilidade cervical)
O ‘N’ verifica a capacidade de extensão do pescoço. Pacientes com imobilização cervical (como nos traumas) ou rigidez podem ter dificuldade de alinhamento das vias aéreas
Farmacologia da ISR: escolha certa para uma via aérea segura
A intubação de sequência rápida envolve o uso coordenado de duas classes principais de fármacos: agentes indutores e bloqueadores neuromusculares, administrados de forma imediata e sequencial para facilitar a intubação orotraqueal com o mínimo de complicações.
Agentes indutores
Os agentes indutores tem como objetivo proporcionar sedação rapidamente. As opções mais utilizadas incluem:
- Etomidato: de ação rápida e hemodinamicamente estável, é ideal em pacientes com instabilidade cardiovascular. Pode causar supressão adrenal transitória.
- Quetamina: promove dissociação e mantém os reflexos respiratórios em alguns casos, bastante útil em pacientes com hipotensão ou broncoespasmos
- Midazolam: benzodiazepínico com ação sedativa, mas de início mais lento. Por isso, menos preferido na ISR pura
- Propofol: potente e de início rápido, mas pode causar hipotensão significativa, sendo melhor em pacientes estáveis.
Bloqueadores musculares
Já os bloqueadores neuromusculares paralisam a musculatura esquelética, abolindo reflexos de tosse e laringoespasmos, além de facilitar a visualização da glote:
- Succinilcolina: bloqueador despolarizante de ação ultrarrápida (início em 30-60s e duração de 5-10 min). Contraindicado em pacientes com hiperpotassemia, trauma muscular extenso, história de hipertermia maligna ou doenças neuromusculares.
- Rocurônio: bloqueador não despolarizante de início um pouco mais lento, mas mais seguro em casos em que a succinilcolina é contraindicada. Duração mais longa, o que exige preparo caso a intubação falhe.
Drogas adjuvantes também são muito utilizadas, principalmente o fentanil, para reduzir a resposta simpática em pacientes com risco cardiovascular. Além disso, para casos de hipertensão intracraniana, pode ser feito a lidocaína IV e atropina para crianças pequenas para prevenir a bradicardia.
Materiais necessários e preparação da equipe
Antes de iniciar o procedimento, é essencial garantir que todo o material esteja disponível e funcional, e que cada membro da equipe saiba sua função. Aqui vai um checklist prático dos materiais e pontos de preparo essenciais para a ISR:
Equipamentos de via aérea
- Laringoscópio com lâminas (curvas e retas) testado e com luz funcionando
- Tubos orotraqueais (de 2 tamanhos adequados para o paciente) com balonete testado
- Guia ou introdutor ("bougie")
- Pinça de Magill
- Seringa de 10 mL para insuflar o balonete
- Fita ou fixador de tubo
- Máscara facial

Materiais de oxigenação e ventilação
- Bolsa-válvula-máscara (BVM) com reservatório e conexão a O₂
- Fonte de oxigênio funcional
- Cânula orofaríngea e/ou nasofaríngea (de tamanhos apropriados)
- Dispositivo supraglótico (ex: máscara laríngea) como plano B
Medicações
- Agente indutor (ex: etomidato, quetamina, propofol, midazolam)
- Bloqueador neuromuscular (ex: succinilcolina, rocurônio)
- Drogas adjuvantes, se indicadas (ex: lidocaína, fentanil, atropina)
- Sedação pós-intubação (ex: midazolam, fentanil, propofol)
Equipe e plano de contingência
Definir claramente:
- Quem intuba
- Quem administra as medicações
- Quem monitora e ventila
Passo a passo da intubação de sequência rápida
Por se tratar de um procedimento que exige precisão, agilidade e um fluxo bem estruturado, seguir um passo a passo ajuda a minimizar falhas e a garantir segurança ao paciente, aumentando a chance de sucesso após a primeira tentativa. Por isso, foi criado os 9P’s da sequência rápida:
- Planejar
- Preparar (drogas, equipe, local)
- Proteger cervical
- Posicionar
- Pré-oxigenar
- Pré-tratamento (fentanil, lidocaína)
- Paralisia e indução
- Prova de posicionamento
- Protocolo pós-tubo
- *Pressão cricóidea
Pegadinhas de prova: o que as bancas adoram cobrar?
A intubação de sequência rápida é um dos temas queridinhos das bancas de residência médica. Contudo, mais do que exigir a simples memorização do passo a passo, as provas costumam explorar detalhes conceituais, indicações específicas e cenários clínicos um pouco mais complexos.
Algumas dicas do que pode aparecer e frequentemente aparece na prova:
Succinilcolina não é para todo mundo
Ainda que seja o bloqueador neuromuscular mais rápido, a succinilcolina é contraindicada em situações que aumentam o risco de hipercalemia, como queimaduras extensas, trauma muscular grave, lesão medular ou AVC antigo.
Pré-oxigenação não é opcional
Muitas questões descrevem um paciente em insuficiência respiratória e partem direto para a indução e bloqueio, sem mencionar a pré-oxigenação. O futuro residente não pode esquecer de que, mesmo em emergências, o médico deverá oxigenar o paciente por pelo menos 3 minutos antes da sequência de drogas.
Drogas adjuvantes: usar ou não usar?
Questões sobre hipertensão intracraniana, IAM, broncoespasmo ou instabilidade hemodinâmica frequentemente envolvem lidocaína, fentanil, quetamina ou etomidato. Não esqueça das indicações específicas dessas drogas.
Capnografia é a confirmação padrão-ouro
Mesmo após boa ausculta e visualização do tubo, a prova pode perguntar qual o método mais confiável para confirmar a posição. A resposta certa será: capnografia (ou capnometria), não ausculta torácica.
Não esquecer da sedação pós-intubação
O paciente intubado com sucesso deve permanecer em sedação e analgesia pós-intubação, mesmo que o paciente esteja sedado na indução inicial. Os cuidados pós-intubação são tão importantes quanto a pré-intubação.
DPOC, asma, trauma: situações especiais
Embora a intubação de sequência rápida siga um protocolo padrão, algumas condições clínicas exigem ajustes estratégicos na abordagem, tanto na escolha das drogas quanto na técnica e no preparo da equipe. Situações como DPOC, asma grave e trauma (especialmente cranioencefálico ou cervical) trazem riscos adicionais e frequentemente são cobradas em provas e vivenciadas na prática emergencial.
DPOC e asma grave: devemos ter cuidado com a hiperinsuflação dinâmica
Pacientes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) ou crise asmática grave apresentam aumento da resistência das vias aéreas e risco de aprisionamento aéreo (air trapping). Durante a ventilação após a intubação, isso pode levar à hiperinsuflação dinâmica, pneumotórax hipertensivo e instabilidade hemodinâmica. Dicas práticas:
- Evite a ventilação com volumes altos ou frequências elevadas
- Prolongue o tempo expiratório
- Use a quetamina como indutor, pois além de promover sedação dissociativa, tem efeito broncodilatador
Trauma cranioencefálico: proteger o cérebro é prioridade
No TCE grave, o principal objetivo da ISR é garantir oxigenação e evitar picos de pressão intracraniana (PIC). A manipulação da via aérea pode gerar resposta simpática intensa, com hipertensão e aumento da PIC.
Condutas específicas:
- Pré-tratamento com fentanil (1-3mcg/Kg) para atenuar resposta adrenérgica
- Considerar lidocaína EV (1,5 mg/Kg), embora seu benefício ainda seja um pouco controverso
- Prefira etomidato para indução (hemodinamicamente neutro)
- Evite hipocapnia ou hiperventilação excessiva, pela possibilidade de reduzir o fluxo cerebral
Trauma cervical ou politrauma representa uma via aérea difícil até que se prove o contrário
Todo paciente com trauma de face, pescoço ou politraumatismo é potencial portador de via aérea difícil. Além disso, pode haver coluna cervical instável, o que exige precaução redobrada na manipulação.
Pontos-chave:
- Imobilização cervical deve ser mantida durante a intubação
- Prefira intubação com ajuda de dispositivos com videolaringoscópio
- Tenha a disposição plano B com máscara laríngea e preparo para cricotireoidotmia
- Avalie sinais de obstrução: sangramento, fraturas faciais, secreções
A intubação de sequência rápida é um procedimento vital para garantir o controle rápido da via aérea em situações críticas. Exige conhecimento técnico, planejamento cuidadoso, escolha adequada de fármacos e domínio de indicações e contraindicações, especialmente em pacientes com DPOC, asma ou trauma. Além da prática clínica, é um tema recorrente em provas de residência, que costumam explorar detalhes conceituais, farmacológicos e situações especiais. Preparação adequada e raciocínio clínico são fundamentais para o sucesso da técnica.
Intubação de sequência rápida: você está realmente preparado?
A ISR não é apenas uma técnica — é uma habilidade salva-vidas. Em cenários críticos, como insuficiência respiratória, trauma grave ou rebaixamento do nível de consciência, cada segundo importa. Dominar a intubação de sequência rápida pode ser a diferença entre salvar uma vida ou perder uma via aérea.
E para quem está se preparando para a residência médica, o desafio vai além da prática clínica: as provas cobram esse tema com profundidade, explorando nuances farmacológicas, contraindicações, estratégias para vias aéreas difíceis e condutas em pacientes com DPOC, TCE ou trauma cervical.
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FONTES:
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