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Publicado em
30/11/23

Carcinoma hepatocelular: o que é, causas, sintomas e tratamento

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Carcinoma hepatocelular: o que é, causas, sintomas e tratamento

O carcinoma hepatocelular (CHC) ou hepatocarcinoma (HCC) é a forma mais comum de neoplasia primária de fígado, sendo a 2ª principal causa de morte por câncer em homens. Além disso, é o 5ª câncer mais comum no mundo, com 85% dos casos ocorrendo em áreas com altas taxas de infecção crônica por vírus da hepatite B e C. Em 90% dos casos, este tumor maligno procede à cirrose.

Neste post, iremos abordar o hepatocarcinoma, seu diagnóstico e como tratar!

O que é o carcinoma hepatocelular?

O hepatocarcinoma é um tipo de tumor primário do fígado, sendo o mais comum, representando 90% dos totais de casos de neoplasia de fígado. Ele ocorre em 85% dos pacientes com cirrose, sendo ela o principal fator de risco. Outros fatores de risco importantes são o vírus da hepatite B e C.

Fisiopatologia

A origem do tumor se dá, na maioria dos casos, a partir de doenças crônicas prévias. O estresse oxidativo é um grande fator de desencadeamento de mutações. Essas podem ocorrer em oncogenes e genes supressores de tumor, como hiperfunção da beta-catenina, ativação da telomerase (oncogenes) e perda de função do gene TP53 (gene supressor de tumor). Nódulos com células displásicas são um achado comum nas afecções hepáticas crônicas, sendo muito frequentes em pacientes com cirrose.

Esquema demonstrando a carcinogênese do carcinoma hepatocelular. Fonte: Hepatocellular carcinoma pathogenesis: from genes to environment | Nature Reviews Cancer 
Esquema demonstrando a carcinogênese do carcinoma hepatocelular. Fonte: Hepatocellular carcinoma pathogenesis: from genes to environment | Nature Reviews Cancer 

Na imagem acima, é possível ver inicialmente que, fatores agressivos ao fígado (álcool, vírus, aflatoxina) irão lesar os hepatócitos do fígado normal. A constante lesão ao parênquima provoca necrose dos hepatócitos, iniciando um processo de cicatrização (fibrose) irreversível. 

O fígado torna-se cirrótico, levando a um processo de hiperplasia, podendo levar ao surgimento de nódulos displásicos. A partir disso, a hiperfunção da beta-catenina, ativação da telomerase e perda da função do TP53 provocam o surgimento de células pouco diferenciadas, caracterizando o carcinoma hepatocelular. 

O tumor pode se apresentar como uma massa unifocal, como múltiplos nódulos distribuídos pelo parênquima e de tamanho variável ou como uma massa difusamente infiltrativa. Se não tratado, possui evolução rápida e a massa tumoral tende a aumentar e interferir nas funções hepáticas.

Quais as causas do carcinoma hepatocelular?

As principais causas e fatores de risco são a hepatite crônica por vírus B ou C, cirrose (presente em 50% dos indivíduos que desenvolvem o câncer), esteatose hepática não alcoólica, consumo excessivo de álcool e doenças hereditárias (hemocromatose, doença de Wilson). E ainda, tabagismo, poluição ambiental e ingestão de grãos e cereais contaminados por aflatoxina, substância cancerígena produzida pelo fungo Aspergillus flavus.

Esquema representando a evolução para o carcinoma hepatocelular. Fonte: Human Fatty Liver Disease: Old Questions and New Insights - PMC 
Esquema representando a evolução para o carcinoma hepatocelular. Fonte: Human Fatty Liver Disease: Old Questions and New Insights - PMC 

No caso da hepatite B, ocorre inserção do genoma viral em locais promotores da transcriptase reversa da telomerase do genoma humano, resultando em mutação que gera o câncer. Um forte preditor de risco em pacientes com o vírus da hepatite B (HBV) inclui níveis séricos elevados de DNA do HBV (iguais ou superiores a 10.000 cópias/mL).

Já na hepatite C, a inflamação crônica na infecção crônica pelo vírus com subsequente fibrose, necrose e regeneração é o que contribui para o desenvolvimento do câncer, assim como ocorre na NASH e na etiologia alcoólica. Para avaliar a etiologia do carcinoma hepatocelular, devem ser solicitados antígeno de superfície da hepatite B, anticorpo anti-HCV, nível de alfa antitripsina, níveis de cobre e saturação de ferro.

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Sintomas de carcinoma hepatocelular

O quadro clínico do paciente é caracterizado por sintomas inespecíficos. São eles: dor abdominal indefinida, mal-estar, febre, fadiga, perda de peso, plenitude abdominal e massa abdominal no quadrante superior direito. O carcinoma hepatocelular não cirrótico pode apresentar-se assintomático na fase inicial da doença.

Caso o tumor evolua, o paciente pode apresentar outras complicações como encefalopatia metabólica, trombose da veia porta e veia cava, ascite, hemorragias, icterícia obstrutiva e abcessos hepáticos. A metástase extra-hepática mais comum é para o pulmão, linfonodo intra-abdominal, osso e adrenal, respectivamente. 

Como fazer o diagnóstico?

Os testes de função hepática, incluindo bilirrubinas, TGO, TGP, fosfatase alcalina e albumina, podem estar elevados na avaliação inicial. Outros achados laboratoriais anormais observados nestes pacientes incluem INR alargado, trombocitopenia, anemia, hiponatremia ou hipoglicemia.

O diagnóstico é dado a partir de exames de imagem, biópsia e elevação da alfa-fetoproteína no soro. O aumento dessa glicoproteína é indicativo de desdiferenciação de hepatócitos, sugerindo processo neoplásico, tendo sensibilidade de 66% e especificidade de 80%. Níveis séricos de alfafetoproteína marcadamente elevados, superiores a 200 ng/ml, são altamente específicos

Os melhores exames para detecção de tumores são a ultrassonografia (USG), tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM), esses últimos utilizando o contraste. O USG é um exame de triagem não invasivo e amplamente utilizado para o diagnóstico do carcinoma hepatocelular e vigilância, sendo capaz de determinar o tamanho, a morfologia, a localização e a invasão vascular do tumor (desde que maior de 2 cm).

Devido ao alto risco de desenvolvimento deste tipo de neoplasia em pacientes com cirrose, o achado de nódulo sólido na USG deve ser avaliado por uma TC ou RM, posteriormente. A realização dos estudos multifásicos é fundamental para a detecção do tumor. 

Se o paciente apresentar histórico prévio de cirrose, o realce do nódulo na fase arterial, seguido de lavagem (Wash-out) do contraste nas fases portal e tardia indicam hepatocarcinoma, como mostrado na TC abaixo.

TC na fase arterial (A) permite identificar lesão hipervascular (seta), que não concentra claramente contraste lipossolúvel na TC realizada 2 semanas após injeção intra-arterial de Lipiodol. Fonte: Radiologia Brasileira - Apresentações incomuns do hepatocarcinoma: ensaio iconográfico 
TC na fase arterial (A) permite identificar lesão hipervascular (seta), que não concentra claramente contraste lipossolúvel na TC realizada 2 semanas após injeção intra-arterial de Lipiodol. Fonte: Radiologia Brasileira - Apresentações incomuns do hepatocarcinoma: ensaio iconográfico 

A biópsia hepática não é feita rotineiramente, pois o procedimento está associado ao risco de disseminação e sangramento do tumor, e falso negativo na falha na obtenção de tecido do local apropriado.

Diagnóstico diferencial

O diagnóstico diferencial deve ser feito com colangiocarcinoma, hiperplasia nodular focal e nódulos regenerativos benignos, encontrados no fígado cirrótico. E mais, com adenoma hepático, linfoma hepático primário, e metástase de outros órgãos.

Tratamento para o carcinoma hepatocelular

Existem várias opções de tratamento para esse tipo de carcinoma. A ressecção do tumor (remoção cirúrgica) é ideal para pacientes em estágios menos avançados, com função hepática preservada e nódulo único de > 2 cm. 

Transplante de fígado

O transplante de fígado é outra opção de tratamento e, nesses casos, a reincidência do câncer ocorre em menos de 15% dos pacientes. Os critérios de Milão para transplante de fígado são um nódulo único menor ou igual a 5 cm de diâmetro; ou não mais que três nódulos, nenhum com diâmetro maior que 3 cm, sem invasão microvascular e disseminação extra-hepática.

Ablação

A ablação é um tratamento minimamente invasivo, indicado para pacientes com tumores pequenos e sem indicação cirúrgica. O procedimento promove mudança brusca de temperatura no local da neoplasia, fazendo com que ele seja destruído sem que haja sua remoção. Outro procedimento minimamente invasivo é a quimioembolização, que atua restringindo o suprimento sanguíneo do tumor, indicada para estágios intermediários.

Quimioterapia sistêmica

A quimioterapia sistêmica é o tratamento de escolha para pacientes em estágios avançados do tumor com preservação das funções hepáticas. O medicamento de primeira linha é o sorafenibe, inibidor de multi quinases.

Prognóstico

O prognóstico do paciente é dado de acordo com o tamanho do tumor, grau de diferenciação na histopatologia e grau de acometimento do fígado. Para além disso, também leva em conta a presença ou ausência de metástases e a avaliação do grau de comprometimento das funções hepáticas. 

Em linhas gerais, a sobrevida em cinco anos do carcinoma hepatocelular é de 18%. O carcinoma hepatocelular com altos níveis de alfafetoproteína, pacientes com diabetes mellitus, e CHC relacionado ao HBV, estão associados a um prognóstico desfavorável.

Conclusão

O carcinoma hepatocelular é o principal tipo de câncer de fígado, sendo altamente relacionado à cirrose hepática. Nas fases iniciais pode ser assintomático, gerando, em fases finais complicações como encefalopatia metabólica, trombose da veia porta, ascite, hemorragias e icterícia. Seu diagnóstico é por meio da TC de abdome com contraste e o tratamento vai depender da fase evolutiva do tumor.

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FONTES:

  • Asafo-Agyei KO, Samant H. Hepatocellular Carcinoma. 2021 Feb 3. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2021 Jan–. PMID: 32644603.
  • KWABENA, O.; et. al. Hepatocellular Carcinoma - StatPearls - NCBI Bookshelf 
  • FILHO, G. B. Bogliolo Patologia. 9 ed. Minas Gerais: Guanabara Koogan, 2016.