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Publicado em
2/11/22

Tromboembolismo Pulmonar: quais os fatores de risco, como diagnosticar e tratar

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Tromboembolismo Pulmonar: quais os fatores de risco, como diagnosticar e tratar

O tromboembolismo pulmonar (TEP) é um dos principais diagnósticos diferenciais de dor torácica e a terceira maior causa de doença cardiovascular no mundo. Apesar disso, continua sendo uma doença muito subdiagnosticada, podendo trazer consequências importantes aos pacientes, como desenvolvimento de insuficiência cardíaca e hipertensão pulmonar crônica.

É mais comum em idosos, maiores de 70 anos, especialmente do sexo masculino e possui diversas causas, mas todas com uma fisiopatologia semelhante, relacionada a inúmeros fatores de risco, como obesidade, diabetes, uso de ACO (anticoncepcional oral combinado), cirurgia de quadril recente, lesão medular e neoplasia maligna.

A gravidade do TEP depende da apresentação hemodinâmica do paciente. Ainda que seja menos comum haver um paciente hemodinamicamente instável (4-5% dos casos), é necessária muita cautela, pois evoluem com morte em 45% das eventualidades. Enquanto isso, se o indivíduo < 50 anos estiver estável e não tiver outras comorbidades, o risco de morte é menor que 1%.

O que é Embolia Pulmonar?

O TEP é definido como uma obstrução na artéria pulmonar ou dos seus ramos por êmbolo. Além da embolia por trombo (que merece mais destaque pela sua frequência e é o assunto de estudo deste artigo), existe também o embolismo aéreo, gorduroso, tumoral ou por metacrilato. É relevante lembrar que o TEP pertence ao espectro do tromboembolismo venoso (TEV), juntamente com a trombose venosa profunda (TVP).

Classificamos o TEP como “em sela” ou “a cavaleiro” quando o trombo fica alojado na bifurcação da artéria pulmonar e, devido a isso, resulta mais facilmente em TEP maciço (instabilidade hemodinâmica – pressão arterial sistólica menor que 90mmHg ou queda > 40mmHg da pressão basal por mais de 15 minutos.

Existe ainda o TEP submaciço, que é quando pacientes normotensos apresentam disfunção ventricular direita ou elevação de marcadores de necrose miocárdica. Outros tipos de TEP (sem ser maciço ou submaciço) são nomeados TEP de menor gravidade, em que o trombo pode estar em artérias lobares, segmentares ou subsegmentares.

Causas 

O TEP pode ser não provocado (20% dos casos, geralmente relacionado a trombofilia) ou provocado (secundário a outras doenças) e surge a partir de um trombo que se descola do endotélio vascular e posteriormente é retido nas artérias pulmonares. Os principais sítios de origem do trombo são nas veias poplíteas, femorais e ilíacas (ramos pélvicos).

Esse trombo é formado pelos fatores da Tríade de Virchow, sendo eles, hipercoagulabilidade (doenças genéticas, doenças com trombocitose), alteração do fluxo sanguíneo (estase ou turbulência venosa) e lesão endotelial (vasculites, traumas, infecções, infiltrações neoplásicas).

As principais causas do TEP provocado são cirurgias de quadril e joelho recentes, gestação ou puerpério, imobilidade por longo período, fraturas em membros inferiores, transfusão sanguínea, câncer, tratamento com quimioterapia, infarto agudo do miocárdio recente (há cerca de 3 meses) e fibrilação atrial.

Quando o TEP evolui para morte geralmente é por haver uma oclusão abrupta da artéria pulmonar ou isquemia na condução elétrica no sistema His-Purkinje. Cerca de 1/3 dos sobreviventes a esses “tipos” de TEP desenvolvem insuficiência cardíaca direita e 5% progridem.

Quadro Clínico

Os sinais de TEP são bem variáveis, pois depende de fatores como tamanho do coágulo, local da obstrução, presença de comorbidades cardíacas ou pulmonares, disfunção cognitiva e idade (jovens costumam ter menos sintomas). Apesar de haver a tríade clássica do TEP, composta por dispneia, dor torácica pleurítica e hemoptise, raramente esses achados vão “juntos”.

A dispneia está presente em 80% dos casos (50% apresentam também ao repouso), a dor torácica em 40%, síncope em até 17%. Pode haver também tosse, diaforese, sintomas neurológicos (confusão mental, convulsões), febre, dor unilateral e edema em membro inferior (devido a TVP).

A maioria dos pacientes com TEP tem ausculta pulmonar limpa (sibilos e estertores são mais comuns em casos de broncoespasmo, pneumonia e infarto pulmonar) e frequência cardíaca normal (<100bpm) ou que se normaliza ainda no departamento de emergência (DE). A saturação de oxigênio tende a ser < 93%, mas pode se encontrar normal também.

Uma das principais formas de apresentação de TEP é a de dispneia não explicada por achados de ausculta, alterações no ECG ou radiografia de tórax.

Diagnóstico

Dentre os pacientes que são suspeitos de TEP, apenas cerca de 20% têm o diagnóstico confirmado e por isso alguns escores foram elaborados para que menos pessoas fossem expostas a exames desnecessários, como o escore de Wells.

Características Pontuação
Antecedente de TEP ou TVP 1,5
FC > 100bpm 1,5
Cirurgia ou imobilização nas últimas 4 semanas 1,5
Hemoptise 1
Neoplasia ativa 1
Sinais de TVP 3
TEP é a principal hipótese 3
Probabilidade clínica
Alta ≥7
Média 2-6
Baixa 0-1
Escore de Wells. Fonte: reprodução EMR, Beatriz Lages Zolin

Pacientes de qualquer probabilidade, mas com certa suspeita de TEP, devem realizar exame de gasometria arterial (verifica-se alcalose respiratória ou mista na maioria dos casos) e eletrocardiograma (ECG) – lembrando que qualquer indivíduo com dor torácica no DE, deve ter ECG interpretado em até 10 minutos.

Apesar de o S1-Q3-T3 ser um achado clássico no ECG de indivíduos com TEP, ele está presente em apenas 10-15% dos casos. O mais comum é encontrar taquicardia, inversão de onda T em V1 e alterações de segmento ST em V1 a V4.

S1-Q3-T3. Fonte: Twitter  https://twitter.com/nickbensonmed/status/1158949859627610112
S1-Q3-T3. Fonte: Twitter

Caso o paciente tenha baixa probabilidade para TEP no escore de Wells, aplicar o escore de PERC (Pulmonary Embolism Rule-Out Criteria), composto por perguntas, e se todas a respostas forem negativas, pode-se excluir TEP e se alguma for positiva, prosseguir investigação, solicitando-se o D-dímero

A diretriz europeia de 2019 sobre TEP cita o escore PERC, mas considera ainda que seu uso não pode ser generalizado. As perguntas do PERC são:

  • Idade ≥ 50 anos?
  • Hemoptise?
  • Frequência cardíaca ≥100 bpm?
  • SatO2 < 95%?
  • Edema unilateral em membro inferior?
  • Cirurgia ou trauma há menos de 4 semanas, com anestesia geral?
  • Antecedente de TEP ou TVP?
  • Uso de estrogênio?

O D-dímero é um produto da decomposição da fibrina e está alto em condições de trombose. No entanto, apesar de não confirmar o diagnóstico de TEP, um D-dímero <1000 ng/ml possibilita descartar TEP em pacientes com baixa probabilidade. Outras causas de D-dímero elevado são isquemia coronariana, neoplasias, queimaduras, insuficiência hepática e renal, eclâmpsia, necrose cutânea e hematomas.

Nos pacientes com média e alta probabilidade de TEP, assim como os com baixa probabilidade, mas com D-dímero alto, deve-se solicitar angiotomografia computadorizada de tórax ou cintilografia (no caso de gestantes ou indivíduos com insuficiência renal) para confirmar o diagnóstico e iniciar tratamento.

A radiografia de tórax não é um exame tão bom para avaliar TEP, pois pode-se encontrar muitos achados inespecíficos e alguns que são muito incomuns, como o sinal de Westermark (obstrução de artéria lobar), presente em apenas 0,4% dos casos ou Corcova de Hampton, apenas em 0,8% dos indivíduos.

Estratificação dos Pacientes

A estratificação pelo score PESI (Pulmonary Embolism Severity Risk) classifica os pacientes pelo risco de mortalidade e através disso, conseguimos definir melhor qual tratamento deve ser seguido.

Variável Pontuação
Idade Idade em anos
Sexo masculino 10
Neoplasia 30
Insuficiência cardíaca 10
DPOC 10
FC >110 bpm 20
Pressão sistólica <100 mmHg 30
Frequência respiratória >30 irpm 20
Temperatura <36ºC 20
Alteração aguda do nível de consciência 60
Saturação arterial de O2<90% 20
Classificação
I <65
II 66-85
III 86-105
IV 106-125
V >125
Escore PESI. Fonte: reprodução EMR/Beatriz Lages Zolin

Pacientes classe I e II são considerados de baixo risco. Para os pacientes da classe III e IV deve-se solicitar dosagem de troponina e BNP (peptídeo natriurético cerebral) e ecocardiograma para avaliar disfunção em ventrículo direito e se apenas um desses exames for alterado, considera-se como risco intermediário baixo.

Tratamento

Pacientes de classe I no escore de PESI podem realizar tratamento domiciliar e internar esse paciente não tem um bom custo-benefício. Alguns indivíduos da classe II também não precisam de internação hospitalar e geralmente recebem alta precoce, em menos de 5 dias. A classe III e IV necessita de internação em enfermaria e a classe V em UTI (unidade de terapia intensiva).

Para todos os pacientes deve-se realizar suporte hemodinâmico – com fluidoterapia e drogas vasoativas (frequentemente necessário) –, oxigenioterapia (se SaO2<90%) e anticoagulação parenteral (heparina de baixo peso molecular é a medicação mais recomendada). 

Alguns autores indicam início de anticoagulação empírica (antes da confirmação diagnóstica) para pacientes com probabilidade pré-teste intermediária (escore de Wells). Para pacientes com contraindicação à anticoagulação (história recente de AVC hemorrágico, cirurgias recentes ou hemorragia ativa) e possuem recorrentes episódios de TEV, pode-se indicar o filtro de veia cava, apesar de ter benefício discutível.

A trombólise é indicada para os pacientes com hipotensão persistente ou disfunção em ventrículo direito com piora progressiva.

Conclusão 

O tromboembolismo pulmonar é uma condição subdiagnosticada, relacionada com os fatores da tríade de Virchow, que possui sintomas variáveis de pessoa para pessoa, a depender do local de obstrução do trombo, idade do paciente e comorbidades associada, mas os mais comuns são dispnéia e dor torácica.

Para diagnosticar deve-se levar em conta principalmente os scores de Wells e de PERC, exame do D-dímero e angiotomografía de tórax. O tratamento é realizado com reposição fluida, oxigenioterapia (se SaO2 < 90%) e anticoagulação. Em pacientes com hipotensão persistente, realizar também a trombólise.

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FONTES:

  • Medicina de Emergência: abordagem prática – USP 2021