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Publicado em
21/7/20

Vitamina D e COVID-19: Nova aliada no tratamento?

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Vitamina D e COVID-19: Nova aliada no tratamento?

Novos estudos sugerem que suplementação de Vitamina D pode reduzir risco de infecção e morte por COVID-19 e outras infecções respiratórias virais.

Ao longo dos anos a vitamina D tem sido alvo de diversos estudos que buscam comprovar seus benefícios, além dos já estabelecidos pela comunidade científica. Classicamente a vitamina D, que na verdade se trata de um pró-hormônio, tem sua principal atuação como reguladora do metabolismo ósseo. Adicionalmente, sabe-se que há um benefício imunológico decorrente do seu uso. No entanto, pouco é conhecido acerca do seu efeito profilático e da sua atuação no sistema imunológico em pacientes infectados pelo novo coronavírus.

A principal fonte de produção da vitamina D é a exposição solar, por meio dos raios ultravioletas tipo B (UVB). A Sociedade Brasileira de Dermatologia recomenda 5 a 10 minutos de exposição solar diária para a síntese natural. Alguns alimentos, especialmente peixes gordos (salmão, atum, sardinha), também são fontes dessa vitamina, porém representam apenas 10%, os outros 90% são obtidos através da síntese cutânea após exposição solar.

Metabolismo da Vitamina D

Também chamada de colecalciferol, a vitamina D tem como principal função regular a homeostase do cálcio, a formação e a reabsorção óssea. Quando exposto à radiação UVB, o precursor cutâneo da vitamina D, o 7-desidrocolesterol, sofre fotólise e origina a pré-vitamina D, que em 48h sofre um rearranjo molecular resultando na formação da vitamina D. Ao chegar no fígado, a vitamina D sofre hidroxilação e é convertida em 25-hidroxivitamina D [25(OH)D], que representa a forma circulante em maior quantidade, porém biologicamente inerte. A etapa final da produção do hormônio acontece nas células do túbulo contorcido proximal do rim, gerando a 1,25 desidroxivitamina D [1,25(OH)2D3], sua forma biologicamente ativa.

Ação no sistema imunológico

A nova pandemia enfrentada pelo mundo ressaltou a necessidade de desenvolver terapias complementares que possam ter efeito sinérgico ao tratamento atualmente utilizado. Além do papel osteogênico já conhecido da vitamina D, também é possível sugerir que ela pode estar envolvida no fortalecimento da defesa imunológica.

Estudos recentes têm sugerido o papel da vitamina D na promoção de mecanismos protetores contra infecções virais, tais como: fortalecimento da barreira celular e aumento da imunidade, tanto inata quanto adaptativa. Além do papel na melhoria da barreira física e da imunidade, também foi possível observar que a vitamina D reduziu níveis de citocinas pró-inflamatórias associadas aos fenótipos de linfócitos Th1, como IL-2, TNF-α e IFN-γ, bem como estimulou a expressão de citocinas anti-inflamatórias associadas aos fenótipos de linfócitos Th2. Adicionalmente, também foi percebida a capacidade de ativação linfocitária, aumento da quantidade e da função das células T reguladoras e estimulação das células T NK.

Novos estudos sugerem que suplementação de Vitamina D pode reduzir risco de infecção e morte por COVID-19 e outras infecções respiratórias virais. Em face de tais benefícios imunológicos, alguns grupos com fatores de risco capazes de influenciar um pior prognóstico, como portadores de doenças crônicas, doenças osteometabólicas, gestantes, obesos, profissionais de saúde e, principalmente, idosos, podem obter benefícios através da análise de níveis séricos de vitamina D com posterior suplementação.

Discussão

Revisões recentes indicam que altas concentrações séricas de 25 (OH)D podem reduzir risco de infecções agudas do trato respiratório, incluindo influenza, pneumonia e coronavírus, principalmente em países onde o inverno é rigoroso e gera uma baixa exposição solar. Para tal benefício, a suplementação deve ser realizada meses antes do inverno, visando alcançar níveis séricos na faixa entre 20-30ng/ml, na qual já existe ganho imunológico.

No entanto, tais estudos incluíram pacientes com níveis séricos basais de vitamina D já dentro da normalidade e que apresentaram ganhos imunológicos consideráveis, mas não capazes de inferir um melhor prognóstico da infecção viral causado pela suplementação.

Nos estudos que incluíram pacientes com níveis insuficientes, foi possível observar que tal benefício imunológico foi mais expressivo, mas só alcançado quando nível sérico, após suplementação, estava na faixa entre 40-60ng/ml. Para alcançar tal nível, ingesta de 2.000-5.000 Ui/dia de vitamina D se mostrou suficiente.

Revisão de literatura recente indicou ser razoável suplementação com vitamina D, pois a ingestão suplementar aumenta os níveis séricos de maneira que apenas a exposição solar não é capaz. Tal suplementação foi realizada através da ingesta diária de 10.000Ui de vitamina D por um mês e, após, manutenção diária com 5.000 Ui, visando estabilizar nível sérico entre 40-60ng/ml. É importante frisar que tal suplementação, quando realizada até 10.000Ui/dia, não foi capaz de gerar nenhuma toxicidade, como hipercalcemia induzida por vitamina D.

A maioria dos países não possui protocolos que suportem a suplementação de vitamina D como tratamento aliado no combate às infecções virais. A hipótese de que a suplementação pode reduzir risco e incidência da COVID-19 deve ser melhor investigada em ensaios adequados para determinar doses corretas, concentrações séricas desejadas e presença de segurança.

Com melhores desenhos de estudos intervencionistas será possível elucidar os reais benefícios da suplementação de vitamina D nos processos infeciosos virais, bem como propor diretrizes que orientem os profissionais de saúde quanto ao manejo correto e consciente, fazendo com que a comunidade médica ganhe um novo aliado no tratamento e os pacientes a possibilidade de um melhor prognóstico.

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